Em meio às mudanças climáticas e às cada vez mais frequentes ondas de calor extremo, um grupo de pesquisadores sugere que o planeta pode começar a sofrer com um novo problema: as falhas na fotossíntese. Segundo o estudo — publicado na revista Nature —, as altas temperaturas parecem dificultar o processo de respiração das árvores, em especial nas florestas tropicais, consideradas “os pulmões da Terra”.
A fotossíntese é um processo no qual a luz do sol é convertida em energia para a planta. Isso se dá a partir de uma reação entre a água captada pelas raízes com o dióxido de carbono (CO2) absorvido pelas folhas, que resulta em glicose (açúcares que servem para o funcionamento do organismo vegetal) e gás oxigênio (O2), que é liberado para a atmosfera.
Como qualquer reação química, essa troca elementar funciona melhor dentro de uma faixa de temperatura ideal, fora da qual o maquinário fotossintético de uma árvore pode falhar. Por conta do aumento das temperaturas globais, descobriu-se que uma parte das folhas nas copas das florestas tropicais já pode ter atingido um limite.
“Nossa pesquisa mostra que as árvores tropicais podem manter a fotossíntese até 46,7°C, em média. Mas o mundo não aquece uniformemente, nem as copas das florestas”, aponta Gregory Goldsmith, um dos responsáveis pelo estudo, em entrevista ao portal Science Alert. “A tolerância ao calor varia entre espécies e populações — possivelmente, até mesmo dentro das folhas da mesma árvore.”
Tolerância ao calor
Para entender se, de fato, algumas folhas estão se aproximando de temperaturas muito altas para a fotossíntese, a equipe liderada pelo ecoinformasticista Christopher Doughty extraiu dados do instrumento ECOSTRESS, da Nasa. A bordo da Estação Espacial Internacional, esse sensor mede as temperaturas da superfície terrestre enquanto gira ao redor da Terra.
Além disso, medições de satélite realizadas entre 2018 e 2020 foram validadas com dados de outros sensores montados em torres terrestres. Esses estavam responsáveis por registrar as temperaturas nas copas superiores de cinco florestas no Brasil, em Porto Rico, no Panamá e na Austrália.
Goldsmith explica que foram necessárias tanto as observações terrestres quanto as de satélite para entender o impacto das temperaturas nas copas tropicais. “Para as temperaturas das folhas, não são realmente as médias que são importantes, mas, sim, os seus valores extremos.”
Por meio dessa metodologia, os cientistas verificaram que algumas regiões atingiram um pico médio de 34°C. Durante os períodos de seca, as folhas chegaram a ultrapassar os 40°C. Uma pequena fração delas, cerca de 0,01%, passou das temperaturas críticas pelo menos uma vez por estação.
“Embora pouco frequente, a ocorrência de temperaturas extremas pode ter um efeito catastrófico na fisiologia de uma folha. Trata-se de um evento de baixa probabilidade e alto impacto”, descreve Goldsmith.
Futuro das florestas
Com base no que se sabe sobre a fisiologia das plantas, as árvores podem fechar seus poros (estômatos) para conservar água à medida que a temperatura aumenta. No entanto, isso pode expor as folhas a temperaturas prejudiciais, uma vez que não conseguem mais esfriar pela transpiração.
Em tempos de seca, quando os solos estão ressecados, esse calor pode ser ainda mais intenso para as árvores com falta de água. A umidade do solo também impacta na temperatura das folhas da copa.
Considerando que muitos dos efeitos interativos do calor e da seca, da água e da temperatura nas plantas ainda são desconhecidos pelos especialistas, os autores se apoiaram em simulações para pensar nas possíveis consequências do aquecimento global nas florestas. A equipe projetou o modelo para responder a três experiências de aquecimento nas quais sensores de temperatura foram colados em folhas individuais nas copas.
O modelo simplifica a dinâmica da floresta com uma série de suposições. Mas, mesmo assim, as simulações sugerem que até 1,4% das folhas superiores da copa podem ficar demasiado quentes para ser fotossintetizadas em cenários de mudanças climáticas e ondas de calor intenso.
Se o aquecimento global exceder os 3,9°C — valor previsto em um dos piores cenários —, poderá ser mais quente do que as florestas podem suportar. Folhas e árvores poderiam começar a morrer, provocando uma enorme perda dessas importantes reservas de carbono.
Os investigadores destacam, porém, que, pelas lacunas que se tem sobre o comportamento das plantas, a pesquisa apresenta um grau considerável de incertezas. Isso significa que ainda é possível reagir e reverter esses efeitos. “Ainda está ao nosso alcance decidir o destino desses domínios críticos de carbono, água e biodiversidade”, conclui Gregory Goldsmith.
Fonte: https://revistagalileu.globo.com/um-so-planeta/noticia/2023/08/fotossintese-pode-estar-falhando-a-medida-que-temperaturas-aumentam.ghtml