– Domingo, palavra originária do latim dies dominicais, que significa “dia do Senhor, o domingo”; para a maioria, um dia de descanso, futebol, lazer e churrasco, mas no último domingo, dia 06 de julho, para um grupo específico de pessoas, foi um domingo atípico, coroado com situações anômalas: Velório do Dr. Brasil do Pinhal Pereira Salomão, visionário no meio jurídico.
– Brasil Salomão nos deixa aos 83 anos de vida, deixando esposa, a Sra. Lucia Helena, uma filha, Sra. Simone, uma nora, Dra. Mariana, uma neta, Maria Júlia, e três netos, Arthur, João Pedro e Joaquim, e outros tantos “filhos” que o acompanharam ao longo de 55 anos de escritório.
– Esse domingo atípico foi marcado por uma cerimônia repleta de momentos que farão parte da vida daqueles que lá estiveram.
– O auditório da sede da 12ª subseção da OAB, em Ribeirão Preto, cedido pela diretoria da entidade dos advogados, foi o início de uma série de homenagens a esse ícone do Direito, prestadas pelos netos, associados, amigos e advogado representante da instituição anfitriã.
– Situações diversas, mas não inesperadas, diferenciaram os velórios dos dois grandes Homens das famílias Viana Salomão no curtíssimo período de apenas nove dias.
– Por ocasião do passamento do Dr. Marcelo, estávamos diante de um jovem com uma vida toda pela frente, preparado naturalmente e pronto para um dia assumir o legado que ajudou a construir, portador de inúmeros predicados e rara beleza, ao ponto de anteriormente ter sido comparado a um Lorde; ao passo que no passamento do segundo grande Homem, Dr. Brasil do Pinhal Pereira Salomão, estávamos diante do epicentro do legado, ao ponto de que aqueles que o homenagearam, em nenhum momento, eximiram-se de confidenciar publicamente as mais diversas passagens com Dr. Brasil.
– O religioso encarregado da cerimônia de despedida, em determinado momento, precisou procurar palavras para evitar dizer que estávamos diante de uma pessoa austera, quando na verdade, todos que ali estavam, sabiam disso; em meio ao emocionante depoimento de um de seus netos, foi registrado que ali, na sua frente, estava um Homem que foi seu pai, avô, tio, padrinho e amigo; outro neto, também tomado pela emoção, e se valendo da oratória similar à do avô e à do pai, abriu parênteses para chamar a atenção de que, se acordado estivesse, seu avô gostaria de saber quem se atreveu a tirar seu bigode, marca registrada desse Homem, e ainda lembrou de momentos maravilhosos que passou na infância sob a proteção e companhia de seu avô, relatando não entender à época quando pessoas diziam que seu avô era enérgico na vida profissional, uma vez que para ele, o avô pregava que em sua casa tudo poderia ser feito, confidenciando que levou essa “autorização” ao pé da letra e quando adulto, mesmo recebendo uma nota dez numa prova de processo civil, foi advertido pelo avô que após o emprego de uma palavra feminina usa-se crase.
– Em continuidade as homenagens, o então nomeado coordenador teatral dos pronunciadores de poemas do escritório, Dr. Henrique Furquim, que, talvez pelo fato de ser careca e gordo, não raras vezes foi confundido propositalmente pelo Dr. Marcelo como se fosse o Dr. Brasil, atributos esses que em determinado momento, renderam-lhe interpretar o papel de um Cardeal, contracenando com o Dr. Brasil que, majestosamente, como em tudo que fazia, além de ter plantado a ideia de reproduzir a peça teatral de Júlio Dantas, “A Ceia dos Cardeais”, encenou o papel de um deles.
– Ao aprendiz e sócio, Dr. Evandro Grili, que presidia as homenagens, coube confessar que enquanto estagiário e em companhia do Marcelo e do Brasil, teve a oportunidade de participar de inúmeras reuniões e conversas institucionais que em razão do sigilo e da ética profissional não poderia expor seus conteúdos, confidencializando, ainda, ter sido treinado para realizar defesa oral, o que aliás aprendeu muito bem diante da maestria com que conduziu aquele momento tão importante.
– Autoridades do meio jurídico se fizeram presentes, dentre elas vários ex-presidentes da OAB, citados nominalmente pelo atual dirigente, Dr. Alexandre Silveira, que, na ocasião, fez lembrar do orgulho que sentia em ter sido eleito com o apoio do escritório de advocacia cujos mentores ali se encontravam.
– Ainda na ordem das homenagens, uma das associadas, Dr. Juliana Sábio, nomeada como coordenadora dos estudos e momentos de orações do escritório, cujos encontros eram realizados diariamente às 11hs, fez lembrar de uma passagem marcante em sua vida que serviu de inúmeras reflexões realizadas pelo Dr. Brasil, no sentido de que “Ninguém fica só. Deus está com você em todos os momentos e continua sendo o principal exemplo da verdadeira paternidade”.
– Emoção não faltou! Antes de encerrar e ao lado daquele Gigante cercado por centenas de coroas de flores e sob olhar cravado das pessoas que ali se encontravam, coube ao coordenador do tributo jurar, em nome de todos associados e colaboradores dos escritórios, cerca de 450 pessoas, que honrarão a boa advocacia que lhes fora ensinada e que continuarão a dar sequência aos projetos e legados deixados por Marcelo Viana Salomão e Brasil do Pinhal Pereira Salomão, comprometendo-se ainda a zelar e cuidar do amigo, outro gigante do Direito, Dr. José Luiz Matthes, que aos prantos a tudo assistia.
– Postado à esquerda do seu professor, na condição de primeiro discípulo do Gigante, esse fiel escudeiro, já de barba grisalha, recebia cumprimentos e palavras afetuosas dos amigos passamento.
– Por fim, coube a esposa do discípulo responsável pela organização das homenagens e, não menos admiradora dos grandes Homens, a Sra. Alessandra Freire, usar de sua experiência e conhecimentos artísticos para cantar, em observância ao ambiente que se encontrava, a obra mais expressiva e imortal de Milton Nascimento, “Encontros e Despedidas”.
– Algo também chamou minha atenção. Por ocasião da cerimônia no Velório do Marcelo, organizamo-nos em fila para prestar condolências ao Dr. Brasil, familiares e amigos, ao passo que no Velório do Dr. Brasil, mais precisamente no final das homenagens rendidas, foi um “trupé”, todos queriam se despedir daquele Gigante adormecido acondicionado naquele ataúde, sem bigode e com ar de um sorriso estampado no rosto, representando a expressão mais genuína da alma em felicidade, pois estava indo ao encontro de seu filho; além do que, quem, em sã consciência, ousaria arrastar uma cadeira no Velório do Marcelo sob o olhar triste, mas atento, daquele pai que, fragilizado por motivos de doença, conseguiu ficar nove longos dias longe de seu filho?
– Presenciamos nesse curto período, a inversão da ordem natural, momento em que um pai sepulta um filho.
– O que dizer de um homem de princípios que se preocupou em deixar um acervo de formação do bom direito, uma herança em capacitação, um espaço cultural composto por simpósios e palestras, uma coordenação em teatro, grupos de proferidores de poemas e estudo religioso, que ministrou aulas de recurso oral, de preceitos imortais, além de ser um admirável conhecedor e defensor do bom direito, na prática mais conhecido com um direito plausível? Afinal, estávamos diante de um Gigante, pai de 453 filhos, que a exemplo de Golias, foi abatido no coração com o passamento de seu filho Marcelo, por certo arremessado por uma funda.
– Fique tranquilo meu amigo, continue sua nova caminhada, você conseguiu. Se em seu velório, não estivesse descansando e reunindo forças para a subida aos céus, teria visto que criou um exército de grandes Homens. Parabéns! Vá e fique em Paz. “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim, terás o que colher”, Cora Coralina.
– Ainda no Domingo ao me afastar da sala que recepcionava o corpo daquele gentleman do bom Direito, tive a leve sensação de estar em um velório americano, face ao buffet organizado pela entidade anfitriã para as pessoas presentes no velório.
– Aproveito para deixar dois recados para os meninos lá do escritório: preservem a sala do Gigante, transformando-a em uma instituição permanente de pesquisa, primeiro porque estamos diante de imortais, e segundo, pelo fato de que ele e Marcelo continuarão presentes entre nós! Aliás, Marcelo e Brasil, assim que as coisas acalmarem “MANDEM NOTÍCIAS DO MUNDO DE LÁ”, frase tirada do citado clássico de Milton Nascimento.
– Propositalmente antes de concluir esta mensagem passei pelo escritório sede desses grandes Homens e pude observar que a Bandeira do Brasil voltou a tremular.
do amigo, admirador e pretenso 454º filho
Carlos Alberto Marcos
Alemão da Assojuris